quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Mais sobre diálogos: verbos de elocução


Encontro Marcado com Fernando SabinoNão é obrigatório, mas é necessário...
O quê?
Conhecer a gramática, oras!
Temos aí uns poucos exemplos de escritores que não se dedicaram ao conhecimento de seus idiomas para além das aulinhas da escola, quanto às regras, e conheceram o sucesso. Digo explicitamente: são exceções.

Se você, como eu, não está no rol dos afortunados pela genialidade incondicional, convém que se apresse e dedique um pouco de tempo, pelo menos, revendo os conceitos básicos e as regras, que no fim das contas, servem para facilitar e não para impor. Até porque, só poderemos quebrá-las ou subvertê-las se soubermos o que estamos fazendo...
Estou preocupada com os seus diálogos, vocês já perceberam...
É que me incomoda esse modismo relacionado ao uso dos verbos de elocução, entre as frases.
Será que sempre é necessário que seja assim?
Vamos começar, analisando o texto do genial Fernando Sabino:
Conversinha Mineira
— É bom mesmo o cafezinho daqui, meu amigo?
— Sei dizer não senhor: não tomo café.
— Você é dono do café, não sabe dizer?
— Ninguém tem reclamado dele não senhor.
— Então me dá café com leite, pão e manteiga.
— Café com leite só se for sem leite.
— Não tem leite?
— Hoje, não senhor.
— Por que hoje não?
— Porque hoje o leiteiro não veio.
— Ontem ele veio?
— Ontem não.
— Quando é que ele vem?
— Tem dia certo não senhor. Às vezes vem, às vezes não vem. Só que no dia que devia vir em geral não vem.
— Mas ali fora está escrito "Leiteria"!
— Ah, isso está, sim senhor.
— Quando é que tem leite?
— Quando o leiteiro vem.
— Tem ali um sujeito comendo coalhada. É feita de quê?
— O quê: coalhada? Então o senhor não sabe de que é feita a coalhada?
— Está bem, você ganhou. Me traz um café com leite sem leite. Escuta uma coisa: como é que vai indo a política aqui na sua cidade?
— Sei dizer não senhor: eu não sou daqui.
— E há quanto tempo o senhor mora aqui?
— Vai para uns quinze anos. Isto é, não posso agarantir com certeza: um pouco mais, um pouco menos.
— Já dava para saber como vai indo a situação, não acha?
— Ah, o senhor fala da situação? Dizem que vai bem.
— Para que Partido?
— Para todos os Partidos, parece.
— Eu gostaria de saber quem é que vai ganhar a eleição aqui.
— Eu também gostaria. Uns falam que é um, outros falam que outro. Nessa mexida...
— E o Prefeito?
— Que é que tem o Prefeito?
— Que tal o Prefeito daqui?
— O Prefeito? É tal e qual eles falam dele.
— Que é que falam dele?
— Dele? Uai, esse trem todo que falam de tudo quanto é Prefeito.
— Você, certamente, já tem candidato.
— Quem, eu? Estou esperando as plataformas.
— Mas tem ali o retrato de um candidato dependurado na parede, que história é essa?
— Aonde, ali? Uê, gente: penduraram isso aí...
That time of year Project 365(2) Day 126Nesse texto, não existem verbos de elocução e isso faz com que ele seja dinâmico e objetivo. Porém, é preciso que cada personagem mostre sua voz, ou não seria possível determinar quem fala o quê.
Outra maneira, é o uso do discurso direto com os verbos de elocução, apontando a pessoa e o modo como falou.
Eles podem aparecer em três posições:
  • Antes da fala, separados por dois pontos
O menino chamou Maria e perguntou:
— O que faz aqui?
  • Depois da fala, separados por vírgula, ou travessão:
— É claro que sei disso, disse-me o vendedor.
  • Intercalados, separados por vírgula, ou travessão
— E tem mais — continuou ela — eu não vou sair daqui!
Quanto mais preciso for seu verbo de elocução, mais a fala da personagem será caracterizada e daí, a importância de ter vários recursos, ou seu texto ficará do tipo: "ele disse, ela disse, nós dissemos, ele falou, ela perguntou"... Cansativo, pobre, repetitivo...

Listinha básica da Madame Livro


Alguns verbos de elocução gerais:
  • dizer, perguntar, responder, exclamar, pedir, aconselhar, ordenar
Alguns verbos de elocução específicos:
  • afirmar, declarar, indagar, interrogar, retrucar, replicar, negar, questionar, objetar, gritar, rogar, sussurrar, murmurar, balbuciar, cochichar, segredar, esclarecer, sugerir, solucionar, comentar, propor, convidar, cumprimentar, repetir, estranhar, insistir, prosseguir, acrescentar, concordar, anuir, intervir, repetir, berrar, protestar, contrapor, desculpar, justificar-se, rir, sorrir, gargalhar, chorar, choramingar
Sugiro que você estude, anote e separe, em suas leituras, os verbos de elocução que os autores costumam usar e coloque-os numa ficha. Na hora do "aperto" é sempre útil sacá-la e escolher um verbo diferente de "disse, falou, respondeu"...
Para os que quiserem evoluir um pouco mais no conceito, segue a classificação proposta por Neves (2000), sobre os verbos de elocução, definindo-os como os que:
(...) sob uma perspectiva funcionalista, podem ser categorizados como sendo verbos introdutores de discurso (tanto o direto como o indireto) e classificados em:
a) verbos de dizer: que são os de elocução propriamente ditos, ou seja, verbos de ação cujo complemento direto é o conteúdo do que se diz. Ex: falar, dizer, gritar, exclamar, repetir;
b) verbos que qualificam o que é dito: estes caracterizam o dizer. Ex: comentar, queixar-se, explicar, protestar, etc.;
c) verbos que circunstanciam ou instrumentalizam o que é dito: introduzem o discurso, mas não necessariamente indicam atos de fala: acalmar, consolar, rir, chorar, suspirar.
Eu disse que estava preocupada, não disse? :)
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Bibliografia:
BARROS, Diana L. P. de FIORIN, José Luiz ( Orgs). Dialogismo, Polifonia, Intertextualidade. São Paulo: Edusp, 1999.
NEVES, M. H. M. Gramática de usos do português. São Paulo:UNESP, 2000.
SABINO, Fernando. Conversinha Mineira. In: A mulher do vizinho. 6. ed. Rio de Janeiro: Ed.Sabiá, 1962.

Um comentário:

  1. ACHEI MUITO BOM ESSE SITE DE VERBO DE ELOCUÇÃO. ELE É MUITO BOM PARA UMA ESTUDADINHA ANTES DAS PROVAS.

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