O quê?
Conhecer a gramática, oras!
Temos aí uns poucos exemplos de escritores que não se dedicaram ao conhecimento de seus idiomas para além das aulinhas da escola, quanto às regras, e conheceram o sucesso. Digo explicitamente: são exceções.
Se você, como eu, não está no rol dos afortunados pela genialidade incondicional, convém que se apresse e dedique um pouco de tempo, pelo menos, revendo os conceitos básicos e as regras, que no fim das contas, servem para facilitar e não para impor. Até porque, só poderemos quebrá-las ou subvertê-las se soubermos o que estamos fazendo...
Estou preocupada com os seus diálogos, vocês já perceberam...
É que me incomoda esse modismo relacionado ao uso dos verbos de elocução, entre as frases.
Será que sempre é necessário que seja assim?
Vamos começar, analisando o texto do genial Fernando Sabino:
Conversinha Mineira— É bom mesmo o cafezinho daqui, meu amigo?— Sei dizer não senhor: não tomo café.— Você é dono do café, não sabe dizer?— Ninguém tem reclamado dele não senhor.— Então me dá café com leite, pão e manteiga.— Café com leite só se for sem leite.— Não tem leite?— Hoje, não senhor.— Por que hoje não?— Porque hoje o leiteiro não veio.— Ontem ele veio?— Ontem não.— Quando é que ele vem?— Tem dia certo não senhor. Às vezes vem, às vezes não vem. Só que no dia que devia vir em geral não vem.— Mas ali fora está escrito "Leiteria"!— Ah, isso está, sim senhor.— Quando é que tem leite?— Quando o leiteiro vem.— Tem ali um sujeito comendo coalhada. É feita de quê?— O quê: coalhada? Então o senhor não sabe de que é feita a coalhada?— Está bem, você ganhou. Me traz um café com leite sem leite. Escuta uma coisa: como é que vai indo a política aqui na sua cidade?— Sei dizer não senhor: eu não sou daqui.— E há quanto tempo o senhor mora aqui?— Vai para uns quinze anos. Isto é, não posso agarantir com certeza: um pouco mais, um pouco menos.— Já dava para saber como vai indo a situação, não acha?— Ah, o senhor fala da situação? Dizem que vai bem.— Para que Partido?— Para todos os Partidos, parece.— Eu gostaria de saber quem é que vai ganhar a eleição aqui.— Eu também gostaria. Uns falam que é um, outros falam que outro. Nessa mexida...— E o Prefeito?— Que é que tem o Prefeito?— Que tal o Prefeito daqui?— O Prefeito? É tal e qual eles falam dele.— Que é que falam dele?— Dele? Uai, esse trem todo que falam de tudo quanto é Prefeito.— Você, certamente, já tem candidato.— Quem, eu? Estou esperando as plataformas.— Mas tem ali o retrato de um candidato dependurado na parede, que história é essa?— Aonde, ali? Uê, gente: penduraram isso aí...
Nesse texto, não existem verbos de elocução e isso faz com que ele seja dinâmico e objetivo. Porém, é preciso que cada personagem mostre sua voz, ou não seria possível determinar quem fala o quê.
Outra maneira, é o uso do discurso direto com os verbos de elocução, apontando a pessoa e o modo como falou.
Eles podem aparecer em três posições:
- Antes da fala, separados por dois pontos
O menino chamou Maria e perguntou:
— O que faz aqui?
- Depois da fala, separados por vírgula, ou travessão:
— É claro que sei disso, disse-me o vendedor.
- Intercalados, separados por vírgula, ou travessão
— E tem mais — continuou ela — eu não vou sair daqui!
Quanto mais preciso for seu verbo de elocução, mais a fala da personagem será caracterizada e daí, a importância de ter vários recursos, ou seu texto ficará do tipo: "ele disse, ela disse, nós dissemos, ele falou, ela perguntou"... Cansativo, pobre, repetitivo...
Listinha básica da Madame Livro
Alguns verbos de elocução gerais:
- dizer, perguntar, responder, exclamar, pedir, aconselhar, ordenar
Alguns verbos de elocução específicos:
- afirmar, declarar, indagar, interrogar, retrucar, replicar, negar, questionar, objetar, gritar, rogar, sussurrar, murmurar, balbuciar, cochichar, segredar, esclarecer, sugerir, solucionar, comentar, propor, convidar, cumprimentar, repetir, estranhar, insistir, prosseguir, acrescentar, concordar, anuir, intervir, repetir, berrar, protestar, contrapor, desculpar, justificar-se, rir, sorrir, gargalhar, chorar, choramingar
Sugiro que você estude, anote e separe, em suas leituras, os verbos de elocução que os autores costumam usar e coloque-os numa ficha. Na hora do "aperto" é sempre útil sacá-la e escolher um verbo diferente de "disse, falou, respondeu"...
Para os que quiserem evoluir um pouco mais no conceito, segue a classificação proposta por Neves (2000), sobre os verbos de elocução, definindo-os como os que:
(...) sob uma perspectiva funcionalista, podem ser categorizados como sendo verbos introdutores de discurso (tanto o direto como o indireto) e classificados em:a) verbos de dizer: que são os de elocução propriamente ditos, ou seja, verbos de ação cujo complemento direto é o conteúdo do que se diz. Ex: falar, dizer, gritar, exclamar, repetir;b) verbos que qualificam o que é dito: estes caracterizam o dizer. Ex: comentar, queixar-se, explicar, protestar, etc.;c) verbos que circunstanciam ou instrumentalizam o que é dito: introduzem o discurso, mas não necessariamente indicam atos de fala: acalmar, consolar, rir, chorar, suspirar.
Eu disse que estava preocupada, não disse? :)
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Bibliografia:
BARROS, Diana L. P. de FIORIN, José Luiz ( Orgs). Dialogismo, Polifonia, Intertextualidade. São Paulo: Edusp, 1999.
NEVES, M. H. M. Gramática de usos do português. São Paulo:UNESP, 2000.
SABINO, Fernando. Conversinha Mineira. In: A mulher do vizinho. 6. ed. Rio de Janeiro: Ed.Sabiá, 1962.
ACHEI MUITO BOM ESSE SITE DE VERBO DE ELOCUÇÃO. ELE É MUITO BOM PARA UMA ESTUDADINHA ANTES DAS PROVAS.
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